Clube do Dharma, Entrevista com o Fundador
Entrevista com Nrisimhananda Dasa
Clube do Dharma completa 1 ano de existência com mais de 500 horas de vídeos e muitos projetos para o futuro.
Volta ao Supremo: Como surgiu o Clube do Dharma, e por que esse nome?
Nrisimhananda: Acho que ele foi surgindo aos poucos na minha mente. Em 2014, eu residia em Campinas, junto com os outros brahmacharis do projeto Lapidar. Nessa época, nós realizávamos muitos encontros de bhakti-yoga no interior de São Paulo, especialmente nas universidades. E uma pergunta frequente que eu ouvia dos jovens estudantes era como eles poderiam usar o dharma material, a vocação profissional que eles estavam aprofundando em seus cursos de graduação, a favor do dharma espiritual, da consciência de Krishna. Infelizmente eu não soube dar uma resposta satisfatória na maior parte das vezes. Foi aí que eu senti que precisávamos discutir mais sobre este ponto.
No movimento Hare Krishna, se você é um músico, cozinheiro, professor de yoga, tem aptidão para vendas ou outras habilidades ligadas às demandas dos projetos já estabelecidos, então você terá uma chance de usar sua natureza material em consciência de Krishna. Caso contrário, o que lhe sobra é apenas viver sua vida profissional de forma a se sustentar e dar alguma doação no final do mês para a ISKCON e usar seu tempo livre para fazer serviço nos templos, que é considerado o serviço devocional de verdade, aquele que vale.
O que normalmente ouvimos é que podemos viver nossa vida social e profissional de forma honesta, com uma boa conduta moral, ser um exemplo para a sociedade e, ao fazermos isso, estaremos servindo a Krishna, demonstrando na prática para o mundo o comportamento de um devoto. Obviamente eu concordo com isso; com certeza isso é necessário. Apenas não acho que seja o suficiente.
Srila Prabhupada disse algumas vezes que ele havia feito apenas metade da sua missão, disseminando por todo o mundo o cantar dos santos nomes e a filosofia de Krishna e criando uma sociedade de devotos dedicada a manter este projeto. Porém, ele disse que precisávamos completar sua missão criando varnasrama, a estrutura social centrada no dharma. Eu acredito que isso será possível quando aprendermos a viver o dharma na arte, na política, na economia, na pesquisa científica, no serviço social, e não apenas em um ambiente monástico ou religioso.
Srila Prabhupada, fundador da Sociedade Internacional para a Consciência de Krishna.
Pensando em tudo isso, percebi que deveríamos ter um projeto que debatesse o dharma no mundo contemporâneo. No começo de 2020, junto com o isolamento social por causa da pandemia, houve também um acréscimo incrível do público de lives. Nessa época, resolvi fazer um programa nas redes sociais do Ashram Vrajabhumi, onde eu residia na época, chamado “Tardes do Dharma”, justamente para elaborar um pouco melhor estes pontos que eu vinha refletindo. Daí, organicamente, o programa foi crescendo até se tornar um projeto à parte. Queríamos um nome simples, descontraído e que tivesse a palavra dharma no meio. “Clube do Dharma” foi a primeira sugestão que apareceu e todos gostaram.
Volta ao Supremo: Como foram surgindo novos programas e novos apresentadores dentro do Clube? Esse era um plano desde o começo?
Nrisimhananda: Os primeiros colaboradores do Clube foram Damodara, que é minha esposa; Mani, então secretária de Vrajabhumi, e Lilesvari, que hoje coordena o Lapidar Clube do Dharma. Com a ajuda delas, pudemos fazer uma boa divulgação, e o público do Clube foi aumentando e se diversificando. Foi aí que pensamos que poderíamos aproveitar a estrutura que estava sendo criada para abordar outros aspectos da consciência de Krishna, e novos programas com novos apresentadores seria a melhor forma de conseguir isso.
Lilesvari trabalha na edição de um episódio da série Ateísmo Vs. Dharma.
Dhira Chaitanya, em uma transmissão ao vivo do programa Dia D.
Dhira e Nityananda são meus amigos de longa data, fomos distribuidores de livros juntos por anos, então foram os primeiros convidados. Dhira conduz o “Dia D”, em que o público é convidado a mais do que ser ouvinte, mas participar de uma meditação guiada com variados temas. Já Nityananda é responsável pelo programa “Além do Vedanta”, que aborda os ensinamentos do Senhor Chaitanya conforme declarados diretamente por Ele, como em Seus diálogos com Rupa Gosvami, Prakashananda Sarasvati e muitos outros contemporâneos.
Nityananda, em gravação em sua casa para o Além do Vedanta.
Depois novos colabores incríveis foram se unindo ao projeto. Hoje temos a família Padma-Sundari, Hari, Radha-lila e Ravi com o programa lúdico “Lilas: Histórias sem Fim”, o Guru-sevananda falando sobre a meditação nos nomes de Krishna (ele está fazendo doutorado no Canadá sobre o tema), Rama-charita com o programa Buddhi e já estamos alinhando novas colaborações para um futuro próximo.
Volta ao Supremo: Qual o tipo de conteúdo que desperta maior interesse das pessoas?
Nrisimhananda: Em geral, aqueles que tratam de temas tabus, como aborto, política nacional e casamento homossexual. As pessoas estão um pouco cansadas de ver esses temas sendo abordados de forma polêmica e sentem necessidade de ver uma discussão mais sensível, honesta e profunda. Apesar das dificuldades, porque não somos peritos em vários desses assuntos, estamos tentando fazer justamente isso, a partir da perspectiva vaishnava.
Volta ao Supremo: Até hoje, qual o episódio que mais gostou de gravar?
Nrisimhananda: Os episódios especiais com participação do meu mestre espiritual, Sua Santidade Chandramukha Swami, e do guru dele, Sua Santidade Hridayananda Dasa Goswami, foram naturalmente os mais empolgantes e gratificantes para a gente.
O que eu achei mais divertido de fazer foi o episódio sobre o dharma nos ensinamentos do mestre Yoda, que foi o episódio de estreia da série “Superalma”. O primeiro episódio da série “Dharma News” foi muito desafiador, mas também foi muito satisfatório.
Volta ao Supremo: Além das discussões aprofundadas de temas polêmicos, o Superalma também é um conteúdo bem diferenciado do que costumamos ver. Poderia falar mais sobre essa série?
Nrisimhananda: Todos os programas do clube refletem a personalidade de seus apresentadores. Cada apresentador fica totalmente livre para contribuir com suas aptidões e como acreditam que a consciência de Krishna deve ser apresentada. O Superalma, igualmente, nasceu do meu desejo de arranjar alguma ocupação missionária para o meu lado nerd. Nas escrituras, sempre vemos grandes sábios, como Narada Muni, ensinando através de analogias com elementos comuns de uma vida rural, que era o padrão naquele momento histórico. Hoje em dia, é a cultura pop que permeia toda a vida social, então nada mais didático e eficiente do que utilizá-la para Krishna.
Damodara nos bastidores, acompanhando comentários ao vivo e atenta a contratempos técnicos.
Já havíamos feito alguns artigos nesta linha para o Volta ao Supremo e todos tiveram boa repercussão. Um deles, “Onze Lições de Yoga com Stan Lee”, foi o mais lido de 2018. Então, achamos que seria interessante ter um quadro de cultura pop no Clube do Dharma.
Já tivemos episódios sobre Star Wars, Marvel, mangás, cinema, games e literatura. E ainda vamos ter este ano uma série especial sobre Matrix, antecedendo o lançamento do quarto filme da série.
Volta ao Supremo: Que outros planos têm para o futuro?
Nrisimhananda: Na temática das lives, estamos sempre atentos à demanda do público e também da comunidade vaishnava. Os devotos atualmente me pediram um conteúdo diretamente sobre Prabhupada, o que eu já estava planejando há algum tempo. Então logo teremos uma nova série de vídeos comentando as cartas que Prabhupada escrevia a seus discípulos. Esse é um tema bem fascinante.
Também estamos tentando expandir nossa estrutura, criar um site, uma plataforma para cursos etc. Queremos também lançar alguns livros sobre o tema do dharma. Em julho, iremos ter um curso de sânscrito com o professor Mukunda, que tem uma experiência de quase três décadas no assunto.
Estamos trabalhando especialmente em dois cursos: “Jornada da Vocação” e “Jornada da Devoção”.
O “Jornada da Vocação” será um curso sobre como podemos descobrir nossa vocação e vivê-la de forma adequada no mundo contemporâneo. A ideia é discutir os diversos arquétipos psicológicos materiais e como o dharma se reflete neles, debater varna (dharma profissional) e asrama (dharma social) na pós-modernidade, a atuação dos modos da natureza nas vocações e a relação entre os mais diversos dharmas e o yuga-dharma, o dharma da era, que é cantar o maha-mantra Hare Krishna. Haverá também estudo de muitos versos e passatempos do Srimad-Bhagavatam que tratam do tema do dharma, além de uma análise do dharma na vida de personalidades históricas de fora do contexto védico, como Abraham Lincoln, Papa Francisco e Sophia de Mello Breyner Andresen.
Já o “Jornada da Devoção” será um curso de formação em bhakti composto de 108 lições, cada uma delas dividida em três partes: “Conhecimento”, “Prática” e “Meditação”. A parte do “Conhecimento” sempre trará uma explicação teológica de algum conceito do vaishnavismo, a parte “Prática” terá algum desafio para o estudante (começar a cantar japa, peregrinar para o templo ou asrama mais próximo, presentear algum amigo com um livro de Prabhupada etc.) e a parte “Meditação” será sempre um verso das escrituras ou alguma canção de um acharya vaishnava para ser decorada pelo aluno. Nosso objetivo é também inserirmos discussões sérias que julgamos fundamentais ao longo do estudo: como sobreviver a uma crise de fé, como não deixar minha autoestima ser afetada pelas minhas dificuldades ao longo da minha vida espiritual e assim por diante.
Volta ao Supremo: Para quem ainda não acompanha o Clube do Dharma, por onde você recomenda começar?
Nrisimhananda: Já temos mais de 500h de conteúdo gravado, e todo esse material está acessível em nosso Facebook, Instagram e canal do YouTube. Algumas boas recomendações são a série Dharma na Bhagavad-gita (https://bit.ly/3hSNbay) e a série Dharma nas Profissões (https://bit.ly/2RJgQbn).